Como uma criança questionando os porquês do
universo ou como a Drew Barrymore em "Como se fosse a primeira
vez" me vi na tentativa de fazer uma descrição do que sou e vivi, algo bem comum entre as dinâmicas
de grupo e a motivação de trabalhos escolares em fazer o
aluno refletir sobre a sua própria existência, e como sábios que somos, começamos lindamente pelo nosso
nascimento e vamos esmiuçando pelo universo das nossas experiências visíveis e
limitadas em nossos anos vividos. Mas me deparei com uma emoção
incomum por um episódio que não vivi, não presenciei e pouco sei sobre os
rostos sofridos de tal acontecimento e desde então, todas as perguntas do tipo
"quem sou eu" encontraram outras respostas que não se resumem aos meus 26 anos.
Sou tudo que passou, sou o índio assustado, o português
vislumbrado, a escrava africana, a ama de leite da menina herdeira,
um jesuíta em missão, o Exército Napoleônico em Portugal e a Família Real em fuga para o
Brasil. Sou os dois lados da Revolução, sou os mencheviques e bolcheviques, sou o hieróglifo egípcio e a prensa
móvel de Gutenberg. Sou um acionista na Crise de 1929, a mãe chorando a perda do filho na
batalha e a criança exterminada em Auschwitz. Sou o cinema preto e branco, o músico em protesto nos
festivais, sou o CD pirata, a música pop e a erudita. Sou a escultura barroca nas Minas
Gerais, sou a Abaporu da Tarsila do Amaral e a arte digital. Sou o medo do mar,
a pegada na lua, a busca de vida em Marte e a criança abortada no útero. Sou um
jovem nas Diretas Já, a cara pintada, a professora cansada e a
tristeza pelo 7x1. Sou o início da publicidade no Brasil, a ditadura da beleza alisando meus
cabelos e a Coca-Cola aumentando minha cintura. Sou o passado da minha família, o nascimento em 5 de Março de 89 e a queda do Muro de Berlim no mesmo
ano.
Sou fruto de lutas passadas, de
liberdades conquistadas, de bandeiras levantadas, de músicos, arquitetos, operários, engenheiros e
políticos. Sou a casa cheia em Januária, a família barulhenta, as histórias do
meu avô e as correções da minha avó. Sou o silêncio
tímido ao lado de estranhos e risada escandalosa em companhia dos amigos, sou
encontro de histórias, mistura de vida e certezas eternas. E estou a acreditar
que tudo mora em mim e muito pouco absorvi e como diz Fernando Pessoa, "estou hoje perplexo, como quem pensou e achou e esqueceu".
Amei o texto! Muito bom!
ResponderExcluirParabéns Leyce!
Gostei muito do texto e de sua escrita Leyce! É suave, diria até com outra metáfora: sua escrita é aveludada! Tamujuntos
ResponderExcluir